quinta-feira, 21 de outubro de 2010

3º Ano - Atividade física para deficientes


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Deficientes que não
entregam os pontos
Departamento da FEF desenvolve metodologia pioneira na área
de atividades físicas adaptadas

ANTONIO ROBERTO FAVA

Escalar montanhas, descer cachoeiras, praticar mergulho e ciclismo são algumas das atividades, além do judô e do atletismo, que já se tornaram rotina na vida de um grupo de alunos da Faculdade de Educação Física (FEF) da Unicamp. Até aí nada de mais, se eles não fossem portadores de deficiências física ou visual. E não é só: os alunos ainda acrescentam em seus currículos a participação em campeonatos internacionais como Pan-Americano, realizado há dois anos na Carolina do Sul, quando o Brasil acabou ficando em primeiro lugar no geral, ganhando de países como o Canadá, Estados Unidos e México. Este ano, o atleta Aurélio Guedes dos Santos, deficiente visual de 34 anos, classificou-se em 2º lugar na Maratona de Tóquio, no Japão.

Atualmente, a FEF tem o Departamento de Estudos e Atividades Físicas Adaptadas, chefiado pelo professor Edison Duarte, cujo principal objetivo é estudar, sob o ponto de vista acadêmico, a atividade física da pessoa portadora de deficiência. E os resultados, até o momento, têm sido os melhores possíveis. A FEF trabalha hoje apenas com deficientes de duas categorias: visuais, com 20 alunos, entre 13 e 56 anos, e físicos, com 18 adultos. Para o segundo semestre do próximo ano deverão ser incluídas novas categorias, como deficiência mental e auditiva.

A participação da Faculdade em competições e eventos esportivos tem sido bastante intensa, revelando nomes de atletas como Fabiana Harumi Sugimori, 21 anos, com deficiência visual, que se sagrou campeã paraolímpica de natação, em Sidney, há dois anos. Ou de Benedito Franco Leal Filho, o Neno, que revelou extraordinário talento para liderar e organizar competições. Neno foi fundador da primeira Associação de Desportos para Cegos, da região de Campinas.

“Com essa iniciativa, o Neno foi o grande responsável pela inclusão de atletas cegos em competições internacionais, entre elas a de Barcelona, Atlanta e Sidney”, diz o professor José Júlio Gavião de Almeida, diretor-associado da FEF. Há a ainda o Wellington Rodrigues, que participou da paraolimpíada de Barcelona, sagrando-se campeão nos 100 e 200 metros. Junto de Wellington está Aurélio Guedes, que participou da paraolimpíada de Atlanta, de Sidney, em 2002, e do Japão, realizada há seis meses, hoje considerado o melhor do mundo na sua modalidade, segundo o professor Gavião.

Processo sistemático – De acordo com o professor Gavião, o esporte manifesta-se de diferentes formas: o conhecido como de alto rendimento, aquele em que o atleta treina intensamente para as competições, e a prática esportiva como processo de aprendizagem, tal como a educação física escolar.
“As pessoas com as quais a FEF trabalha, tanto as deficientes físicas quanto as visuais, podem utilizar-se do esporte como forma de aprendizagem, de desenvolvimento, e não de treinamento exclusivo, visualizando a performance de alto rendimento”, explica Gavião. No entanto, ressalta que há atletas que praticam atividades de alto rendimento, com o propósito de participar de campeonatos estaduais e até mesmo internacionais, que compreendem a maioria das modalidades esportivas.


Os professores Edison Duarte (à esquerda) e José Júlio Gavião de Almeida: revelando campeões

Segundo o professor Edison Duarte, a FEF vem desenvolvendo uma série de trabalhos bastante significativos. Os mais expressivos referem-se aos destinados à formação de recursos humanos na área de educação física – pesquisadores da área, professores universitários, técnicos e coordenadores esportivos em modalidades de âmbito nacional, além de docentes atuando em associações e instituições para portadores de deficiência.

“A Unicamp é a Universidade que mais tem formado mestres e doutores na área de atividade física adaptada”, diz Duarte. Essa formação se desenvolve em várias frentes. Quer dizer, tanto no que diz respeito às pessoas que trabalham com pesquisa nas universidades brasileiras, como as que atuam em associações e federações esportivas, ocupando as mais variadas funções, preparando seus atletas para competições em campeonatos internacionais e paraolimpíadas.

Intercâmbio – O modelo de trabalho com deficientes físicos e visuais, adotado pela Unicamp, encontra similares desenvolvidos por grupos de outras instituições de ensino e pesquisa brasileiras. “Temos observado que a Universidade de Uberlândia é a que mais se aproxima da Unicamp”, diz Duarte. No entanto, a instituição mineira, embora dotada de indiscutíveis atributos, não possui o mesmo nível de formação que a Unicamp.

“Dificilmente uma outra universidade brasileira tem um trabalho sistemático como o da Unicamp. Fora do Brasil, pelo menos na América Latina, não há um trabalho com um programa didático (ensino e pesquisa) inteiramente voltado para o deficiente físico, visual, auditivo ou mental”, conclui o professor.

O que não acontece em alguns países da Europa, principalmente a Bélgica, na Universidade Católica de Leuven, considerada o principal centro formador de recursos humanos para todas as áreas da atividade física adaptada. Vale ressaltar que o programa da Universidade de Leuven engloba 25 outras universidades espalhadas pelo mundo. Inclusive a Unicamp, com a qual mantém convênio que prevê o intercâmbio de professores entre os dois países. Por outro lado, já se tornou rotina alunos de pós-graduação e de doutorado da Unicamp freqüentarem os laboratórios da Universidade de Leuven. O professor Duarte foi um dos que ficaram na Bélgica durante um período de quatro meses.

É preciso que se diga que em termos de atividades esportivas, o grande parceiro da Unicamp, quando se trata da inclusão de deficientes visuais, é hoje a Sociedade Brasileira de Desportos para Cegos. Paralelamente, há ainda a participação do Comitê Paraolímpico Brasileiro, que atua com todas as deficiências – físicas, auditivas, visuais e mentais.

Por iniciativa de um grupo de professores da própria Unidade, mais especificamente do professor Paulo Ferreira de Araújo, a FEF criou, em 1997, a Federação Paulista de Basquete sobre Rodas, cujo principal propósito é proporcionar a inserção de pessoas com deficiência física em competições estaduais, nacionais e até mesmo internacionais. “De modo geral, os nossos grandes parceiros são as associações nacionais, como a IBSA (Federação Internacional de Desportos para Cegos) e o próprio Comitê Paraolímpico Internacional, instituição que administra o esporte de alto rendimento em nível nacional, praticado por atletas portadores de todas as deficiências.

Modalidades para os deficientes visuais

A Faculdade de Educação Física (FEF) da Unicamp tem um bem-estruturado programa de atividades esportivas que se destina aos “alunos” portadores de deficiência visual.

Golball – Jogo praticado por atletas cegos ou com baixa visão, cujo objetivo é arremessar a bola sonora com as mãos no gol do adversário. Cada time joga com três jogadores, e todos os atletas usam vendas nos olhos.

Judô – É praticado por deficientes visuais de ambos os sexos. A principal adaptação feita para essa modalidade é que os atletas iniciam o combate já com a “pegada” no companheiro.

Atletismo – Os deficientes visuais realizam a maioria das provas, com exceção das que contêm barreira. As provas de 100 são corridas individualmente. Nas corridas, os atletas cegos ou com pequeno resíduo visual correm acompanhados de um guia que, nas competições internacionais, são atletas convencionais, também de alto nível, para que possam acompanhar os deficientes visuais.

Futebol de salão – As equipes de atletas são divididas em cegos totais – apenas o goleiro enxerga perfeitamente – e aqueles que possuem pouca visão. Na categoria de cegos, todos os atletas deverão estar vendados. As regras são basicamente as mesmas do esporte praticado pelo não-deficiente.

Natação – Participam todas as categorias. A principal adaptação para essa modalidade é feita na “virada”, quando o técnico poderá avisar sobre a proximidade da piscina, por meio de um toque com um cabo de madeira ou outro material com ponta de espuma. Os nadadores deficientes deverão nadar com óculos tipo “blackout”.


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